LEI MARIA DA PENHA – 11.340/06
É uma lei multidisciplinar.
ORIGEM DA LEI
Antes de 1990 – toda e qualquer violência era tratada da mesma forma, como violência comum.
1990 - o Brasil entrou na onda da especialização da violência. Retirou do caldo comum diversas espécies de violência.
Exemplos:
Lei 8.069/90 – ECA – violência contra criança e adolescente.
Lei 8.072/90 – Crimes hediondos – retirou do caldo comum as violências hediondos, dando-lhes tratamento especial.
Lei 8.078/90 – CDC – violência contra o consumidor.
Lei 9.099/95 – violência de menor potencial ofensivo. O grande erro dessa lei foi não ter ressalvado a violência doméstica e familiar.
Lei 9.503/97 – Código de Trânsito Brasileiro – violência no trânsito.
Lei 9.455/97 – tortura.
Lei 9.605/98 – violência contra o meio ambiente.
Estatuto do Idoso/93 – violência contra o Idoso.
2006 – Lei 11.340 – Lei Maria da Penha – violência doméstica e familiar contra a mulher. Sua constitucionalidade é questionada, porque toca na discussão entre a desigualdade entre homens e mulheres (guerra dos sexos).
FINALIDADES DA LEI:
Art. 1º, lei 11.340/06. Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.
1 – Coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher.
2 – Assistir à mulher vítima de violência doméstica e familiar.
3 – Proteção à mulher vítima de violência doméstica e familiar.
4 – Criação do Juizado da violência doméstica e familiar contra a mulher.
A lei é assistencialista, preventiva, protetiva, não tem caráter penal, mas civil.
Polícia Civil/RJ – 2ª fase: A lei Maria da Penha pode ser aplicada ao transexual?
1ª corrente: O transexual geneticamente não é mulher, não estando abrangido pela Lei 11.340/06. Para esta corrente conservadora, a genitália passa a ter conformidade feminina, mas não é feminina) minoritária.
2ª corrente: se a pessoa portadora de transexualismo transmutar suas características sexuais (por cirurgia e de modo irreversível), deve ser encarada de acordo com sua nova realidade morfológica, permitindo-se, inclusive, retificação de registro civil – CRISTIANO CHAVES E NELSON ROSENVALD(Direito Civil - Teoria Geral, Lumem Iuris). Esta corrente é majoritária e está presente nos Tribunais Superiores. STJ tem permitido alteração de registro civil.
O transexual possui dicotomia físico-psíquica. Pensa ser de um gênero sexual diferente do corpo físico. Nem todo médico é autorizado a fazer a ablação do órgão sexual. A ablação de órgão sexual é lesão corporal gravíssima.
CONSTITUCIONALIDADE DA LEI
1ª corrente – A lei Maria da Penha é inconstitucional.
* Ofensa ao § 5º, art. 226, CF/88 ofende a isonomia entre os sexos, conferindo mais direitos à mulher que ao homem.
Art. 226, § 5º, CF/88 - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.
* Ofensa ao § 8º, art. 226, CF/88 visa proteger cada pessoa que integra a família, não só a mulher. A lei Maria da Penha ficou aquém do mandamento constitucional.
Art. 226, § 8º, CF/88 - O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.
Questionamentos da 1ª corrente:
- A mãe que é agredida pelo filho está protegida, mas porque o pai que é agredido pelo filho não está protegido?
- A irmã que é agredida está protegida. Porque o irmão que é agredido não tem a mesma proteção?
- Numa agressão mútua o que justifica a mulher ficar amparada pelo presente diploma e o homem não?
- Sabendo que a violência doméstica não se resume na agressão do marido contra a mulher, qual o motivo de se proteger a filha agredida pelo pai e o filho agredido não?
- para uma agressão do filho contra a mãe há lei específica protegendo a vítima, porém para a sua agressão contra o pai não?
Obs: tipos penais que discriminavam o homem foram alvo de recentes mudanças legislativas, corrigindo a odiosa discriminação, como ocorreu no tráfico internacional sexual (só admitia tráfico de mulher) e o atentado ao pudor mediante fraude. A Lei Maria da penha volta a discriminar o homem.
Essa primeira corrente é minoritária, nessa linha: Valter Franco.
2ª corrente – é constitucional STJ.
* O art. 226, § 5º, CF/88 enuncia igualdade material e não, formal. Ou seja, tratar os iguais de maneira igual e os desiguais de maneira desigual, na medida de suas desigualdades.
* Existem dois sistemas de proteção do individuo:
- Sistema de proteção geral: não tem destinatário certo. Código Penal (abrange homem e mulher como vítimas). Os crimes de violência doméstica no Código Penal, homem e mulher podem ser vítimas.
- Sistema de proteção especial: tem destinatário certo. Lei Maria da Penha (só abrange a mulher vítima). Quer garantir uma igualdade prevista em lei, mas que de fato não se respeita. A Lei Maria da Penha tem espírito de ação afirmativa. A lei respeita a mulher, a realidade é que a desrespeita, por isso é necessária uma proteção maior.
OBSERVAÇÃO: tem ADECON em tramitação no STF visando a constitucionalidade dessa lei.
OBSERVAÇÃO: Temos jurisprudência permitindo ao juiz, no uso do seu poder geral de cautela, estender as medidas protetivas da Lei 11.340/06 também para o homem vítima de violência doméstica e familiar. (TJ/MG). Tem juiz que aplica as medidas protetivas aos idosos.
OBSERVAÇÃO: a Lei Maria da Penha protege a mulher-vítima independentemente do sexo do agressor (qualquer pessoa que agride mulher no ambiente doméstico).
A ação afirmativa do Estado que busque a igualdade substantiva, após a identificação dos desníveis socioculturais que gere a distinção entre iguais/desiguais, não se pode tomar como inconstitucional já que não lesa o princípio da isonomia, pelo contrário: busca torná-lo concreto, efetivo. Outra ação afirmativa são as cotas nas universidades públicas.
Afirmar que um ou outro artigo ser inconstitucional não torna toda a lei inconstitucional. Podemos insurgir contra um ou outro artigo.
Aprofundar o tema: páginas 1163 a1277 do livro Legislação Criminal Especial, o volume 6 da Coleção Ciências Criminais, Coord. LFG e Rogério Sanches Cunha -
CONCEITO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR
Art. 5º, Lei 11.340/06. Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão BASEADA NO GÊNERO que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:
I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;
II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;
III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual.
“Baseada no gênero”: Tratar a vítima com desprezo, preconceito, discriminação, opressão, o opressor objetaliza a vítima. Agressão motivada na opressão a mulher, violência preconceito, aproveitando-se da vunerabilidade da vítima. Somente nesses casos há aplicação da lei. Se a violência não guardar ligação com essas formas, não há aplicação da Lei Maria da Penha, mas sim da Lei 9.099/95. Ex: o pai bateu na ex mulher por não poder ver os filhos – essa violência não foi baseada no gênero, ele poderia agredir qualquer pessoa que o impedisse de ver os filhos, poderia ser o avô ou o tio das crianças.
As Turmas do STJ
Existem três violências de gênero conhecidas mundialmente:
a) contra a criança – ECA
b) contra o idoso – Estatuto do Idoso
c) contra a mulher – Lei Maria da Penha
Análise dos incisos:
I – violência doméstica e familiar ocorrida no ambiente caseiro. Dispensa vínculo familiar.
“esporadicamente agregadas”: empregada doméstica.
II – exige vínculo familiar (abrange o parentesco por afinidade – ex: sogra) e dispensa o ambiente caseiro.
“vontade expressa”: adoção.
III – abrange namorados, ex-namorados, amantes, etc. A doutrina crítica esse inciso em razão de ter ultrapassado o espírito da lei.
OBSERVAÇÃO: O STJ, no Conflito de Competência 91.980, julgado dia 08.10.2008 e publicado dia 05.02.2009, interpretou o inciso III do art. 5º da Lei 11.340/06 de forma restritiva, não abrangendo relação entre ex-namorados. Já no Conflito de Competência 103.813, julgado dia 24.06.2009 e publicado dia 03.08.2009, decidiu abranger ex-namorados a questão não está consolidada no STJ. Na 1ª, a agressão foi de gênero e a 2ª não foi de gênero. (verificar julgados)
Parágrafo único – protege as vítimas nas relações homoafetivas.
MAGISTRATURA DE SÃO PAULO
Qual relação homoafetiva: feminina ou masculina?
No concurso, foi considerada para os dois, mas a questão foi anulada. Logo em seguida, o TJ editou resolução no sentido de que só se aplica às relações homoafetivas femininas.
Art. 226, CF/88, reconhece três espécies de família:
a) oriunda do casamento entre homem e mulher.
b) oriunda de união estável entre homem e mulher.
c) monoparental.
Código Civil/02 repetiu o conceito de família da CF/88.
OBSERVAÇÃO: a relação homoafetiva ficou esquecida.
Com a Lei Maria da Penha, Maria Berenice Dias entende que o conceito de família foi alargado, abrangendo a relação homoafetiva, com isso, o juiz pode começar o direito de família à relação homoafetiva.
FORMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER
Art. 7º, Lei 11.340/06. São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; (VIAS DE FATO A HOMICÍDIO)
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.
Violência doméstica e familiar é gênero que tem como espécie crime, por exemplo, homicídio. Pode ser também contravenção penal, como: vias de fato. Não há crime de violência doméstica e familiar. A violência doméstica e familiar pode configurar ainda como fato atípico, mas a mulher continua a ser protegida. Ex: adultério não é mais crime, mas pode configurar violência psicológica e por isso, a mulher pode ser protegida pela Lei Maria da Penha.
MEDIDAS DE PREVENÇÃO À MULHER VÍTIMA
Art. 8º, Lei 11.340/06. A política pública que visa coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher far-se-á por meio de um conjunto articulado de ações da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e de ações não-governamentais, tendo por diretrizes:
I - a integração operacional do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública com as áreas de segurança pública, assistência social, saúde, educação, trabalho e habitação;
II - a promoção de estudos e pesquisas, estatísticas e outras informações relevantes, com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia, concernentes às causas, às conseqüências e à freqüência da violência doméstica e familiar contra a mulher, para a sistematização de dados, a serem unificados nacionalmente, e a avaliação periódica dos resultados das medidas adotadas;
III - o respeito, nos meios de comunicação social, dos valores éticos e sociais da pessoa e da família, de forma a coibir os papéis estereotipados que legitimem ou exacerbem a violência doméstica e familiar, de acordo com o estabelecido no inciso III do art. 1º, no inciso IV do art. 3º e no inciso IV do art. 221 da Constituição Federal;
IV - a implementação de atendimento policial especializado para as mulheres, em particular nas Delegacias de Atendimento à Mulher; (INCLUSIVE COM RECURSOS HUMANOS COMPATÍVEIS PARA INVESTIGAR ESSES CRIMES: DELAGADA, INVESTIGADORAS, ETC)
V - a promoção e a realização de campanhas educativas de prevenção da violência doméstica e familiar contra a mulher, voltadas ao público escolar e à sociedade em geral, e a difusão desta Lei e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos das mulheres;
VI - a celebração de convênios, protocolos, ajustes, termos ou outros instrumentos de promoção de parceria entre órgãos governamentais ou entre estes e entidades não-governamentais, tendo por objetivo a implementação de programas de erradicação da violência doméstica e familiar contra a mulher;
VII - a capacitação permanente das Polícias Civil e Militar, da Guarda Municipal, do Corpo de Bombeiros e dos profissionais pertencentes aos órgãos e às áreas enunciados no inciso I quanto às questões de gênero e de raça ou etnia;
VIII - a promoção de programas educacionais que disseminem valores éticos de irrestrito respeito à dignidade da pessoa humana com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia;
IX - o destaque, nos currículos escolares de todos os níveis de ensino, para os conteúdos relativos aos direitos humanos, à eqüidade de gênero e de raça ou etnia e ao problema da violência doméstica e familiar contra a mulher.
FORMAS DE ASSISTÊNCIA À MULHER VÍTIMA
Art. 9º, Lei 11.340/06. A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, no Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente quando for o caso.
§ 1º O juiz determinará, por prazo certo, a inclusão da mulher em situação de violência doméstica e familiar no cadastro de programas assistenciais do governo federal, estadual e municipal.
§ 2º O juiz assegurará à mulher em situação de violência doméstica e familiar, para preservar sua integridade física e psicológica:
I - acesso prioritário à remoção quando servidora pública, integrante da administração direta ou indireta;
II - manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses.
§ 3º A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar compreenderá o acesso aos benefícios decorrentes do desenvolvimento científico e tecnológico, incluindo os serviços de contracepção de emergência, a profilaxia das Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) e outros procedimentos médicos necessários e cabíveis nos casos de violência sexual.
Tríplice assistência:
a) Assistência social
b) Assistência à saúde (SUS)
c) Assistência à segurança (Polícia Civil – art. 11)
Art. 11, Lei 11.340. No atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, a autoridade policial deverá, entre outras providências:
I - garantir proteção policial, quando necessário, comunicando de imediato ao Ministério Público e ao Poder Judiciário;
II - encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal;
III - fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de vida;
IV - se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou do domicílio familiar;
V - informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços disponíveis.
O afastamento a que se refere o inciso II, § 2º, art. 9º, tem prevalecido o entendimento que é afastamento suspensão, sem o recebimento de salário. A lei entende que a competência é do juiz estadual da Justiça Comum. Tem doutrina criticando o dispositivo, entendendo que é inconstitucional vez que se trata de competência trabalhista, de modo que só poderia ser alterada por emenda constitucional.
MEDIDAS PROTETIVAS
Art. 19. Lei 11.340/06. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida.
§ 1º As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas de imediato, independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério Público, devendo este ser prontamente comunicado.
§ 2º As medidas protetivas de urgência serão aplicadas isolada ou cumulativamente, e poderão ser substituídas a qualquer tempo por outras de maior eficácia, sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados.
§ 3º Poderá o juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida, conceder novas medidas protetivas de urgência ou rever aquelas já concedidas, se entender necessário à proteção da ofendida, de seus familiares e de seu patrimônio, ouvido o Ministério Público.
As medidas protetivas podem ser concedidas de ofício ou mediante provocação.
QUAIS AS MEDIDAS PROTETIVAS
Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;
c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;
IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
§ 1º As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público.
§ 2º Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições mencionadas no caput e incisos do art. 6o da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso.
§ 3º Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial.
§ 4o Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no caput e nos §§ 5o e 6º do art. 461 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil).
Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:
I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;
II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor;
III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;
IV - determinar a separação de corpos.
Art. 24. Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou daqueles de propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar, liminarmente, as seguintes medidas, entre outras:
I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida;
II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial;
III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor;
IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida.
Parágrafo único. Deverá o juiz oficiar ao cartório competente para os fins previstos nos incisos II e III deste artigo.
OBSERVAÇÃO: são medidas cautelares cíveis. Cautelaridade: como tal, as medidas protetivas devem preencher os dois pressupostos tradicionalmente apontados pela doutrina: periculum in mora e fumus bonis iuris.
A ação principal deve ser proposta no prazo de 30 dias?
1ª corrente – o art. 806, CPC deve ser observado, se não propuser a ação principal em 30 dias ocorrerá a caducidade da medida.
2ª corrente – o art. 806, CPC não precisa ser observado. A medida perdura enquanto comprovada a necessidade STJ.
OBSERVAÇÃO: O TJ/RS na apelação criminal 70019552579, publicada no dia 23.10.2007, decidiu: “Descabe a manutenção de medidas protetivas se já foi extinta a punibilidade do indiciado, caso em que a própria vítima renunciou ao direito de representação”.
Desrespeito à medida protetiva imposta à vítima: cabe prisão preventiva. Art. 20, Lei 11.340 + art. 313, IV, CPP.
Art. 20, Lei 11.340/06. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial.
Art. 313, CPP. Em qualquer das circunstâncias, previstas no artigo anterior, será admitida a decretação da prisão preventiva nos crimes dolosos: (Redação dada pela Lei nº 6.416, de 24.5.1977)
IV - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência. (Incluído pela Lei nº 11.340, de 2006)
A medida protetiva é o principal e a prisão preventiva é acessória. O legislador chama de prisão preventiva uma prisão civil, vez que as medidas protetivas têm natureza civil. Nesse caso, questiona-se a constitucionalidade do dispositivo, pois prisão civil só cabe nos casos previstos na CF/88, o legislador ordinário não pode criar outras. Contudo, não é o raciocínio que prevalece.
No STJ prevalece a constitucionalidade da prisão preventiva, medida cabível mesmo quando o crime é punido com detenção (HC 132379/BA, publicado dia 15.06.2009).
OBSERVAÇÃO: Como toda prisão preventiva é imprescindível a presença dos fundamentos trazidos pelo art. 312, CPP.
ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA
Finalidade: criação do Juizado da violência doméstica e familiar contra a mulher.
Local em que existe Juizado da Mulher já criado:
- Justiça comum estadual
- Tem competência cível e criminal:
a) juiz aplicará as medidas de urgência
b) analisará a ação cível
c) analisará a ação penal
Art. 14, Lei 11.340. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e criminal, poderão ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher.
Parágrafo único. Os atos processuais poderão realizar-se em horário noturno, conforme dispuserem as normas de organização judiciária.
Local em que não existe Juizado da Mulher criado;
- Justiça Criminal comum
- Acumula as competências cíveis e criminais;
a) analisa a medida de urgência
b) ação penal
A ação cível principal tem que continuar sendo proposta perante o juízo cível competente. O juiz cível pode revogar, alterar, acrescentar ou conceder outra medida de urgência, ele não está atrelada às medidas de urgência concedidas no juízo criminal.
Art. 33, Lei 11.340/06. Enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, as varas criminais acumularão as competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, observadas as previsões do Título IV desta Lei, subsidiada pela legislação processual pertinente.
Parágrafo único. Será garantido o direito de preferência, nas varas criminais, para o processo e o julgamento das causas referidas no caput.
Qual câmara, cível ou criminal, é a competente para julgar recurso no qual concede ou nega medida protetiva?
Há divergência, tem decisões para os dois lados.
Em caso de homicídio nos lugares onde já existe Juizado criado, onde correrá a 1ª fase do procedimento do júri?
O STJ, no HC 73.161/SC, julgado dia 29.08.2007, assim decidiu: “Ressalvada a competência do Júri para o julgamento do crime doloso contra a vida, seu processamento, até a fase de pronúncia, poderá ser o Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher”.
Já no HC 121.214, o STJ mudou de posição entendendo que o processo não pode correr perante o Juizado, mesmo que em contexto de violência doméstica (julgado dia 19.05.2009).
PROCEDIMENTO
Art. 41, Lei 11.340/06. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995.
Lei 9.099/95 Juizado das infrações penais de menor potencial ofensivo.
Medidas despenalizadoras:
a) Composição civil
b) Transação penal
c) Suspensão condicional do processo
d) Representação na lesão corporal dolosa leve e culposa
O art. 41 só impede a Lei 9099/95 aos crimes, não às contravenções penais.
Apesar de a maioria admitir a lei 9099/95 quando se tratar de contravenção penal, o STJ interpretou que a expressão “crimes” deve abranger a contravenção penal de gênero, impedindo as medidas despenalizadoras da lei 9099/95 (conflito de competência 102571, publicado dia 03.08.2009).
CONTRAVENÇÃO PENAL CRIME
Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) Inquérito Policial – em flagrante
Audiência preliminar:
- composição civil
- transação penal
OBSERVAÇÃO: na transação penal deve-se observar o art. 17 da Lei 11.340: É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.
A pena deve ser de caráter pessoal e não, real. Não tem audiência
Denúncia (processo-crime)
- suspensão condicional do processo Denúncia (processo-crime):
- descabe suspensão condicional do processo.
OBSERVAÇÃO: TJ/SP e outros tribunais têm admitido suspensão condicional do processo (não é instituto exclusivo de crimes da Lei 9099/95).
Julgamento:
- havendo condenação, também deve observar o art. 17 da lei. Julgamento:
- havendo condenação, deve-se observar o art. 17 da lei.
NATUREZA DA AÇÃO PENAL NA LESÃO CORPORAL DOLOSA LEVE
Antes da lei 9099/95 Depois da lei 9099/95 Lei 11.340/06
Ação penal pública incondicionada O art. 88 da lei transformou em ação penal pública condicionada No caso de violência doméstica e familiar contra a mulher, não se aplica a lei 9099/95
Duas correntes:
1ª – Ação pública incondicionada.
Fundamentos:
a) A lei expressamente vedou a aplicação da Lei 9099/95.
b) Trata-se de grave violação aos direitos humanos, incompatível com o instituto da representação.
2ª – Ação pública condicionada.
Fundamentos:
a) A lei, no art. 41, veda medida despenalizadora exterior à vontade da vítima (composição civil, transação penal e suspensão do processo), e não a medida inerente a vontade da vítima (representação).
b) A violência está dentro da família, fato que merece tratamento extrapenal (medidas sociais, assistência social).
OBSERVAÇÃO: A questão não está consolidada no STJ, mas a mais recente decisão do Tribunal Superior é no sentido de que depende de representação (REsp 1.097.042/DF, julgado dia 24.02.2010).
RETRATAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO
Art. 16, Lei 11.340/06. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia (RETRATAÇÃO) à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.
OBSERVAÇÃO: o art. 25, CPP admite retratação até o oferecimento da denúncia e na Lei Maria da Penha é até o recebimento.
OBSERVAÇÃO: há uma verdadeira solenidade com a presença do juiz e do MP. Contudo, foi esquecida a presença do Defensor de forma a garantir o verdadeiro contraditório.
OBSERVAÇÃO: A retratação só será homologada se livre e sincera. Se perceber qualquer coação, a peça acusatória será recebida.
Dica: Ler o capítulo 21(páginas 1163 a 1277 - material completíssimo: posicionamento da doutrina, jurisprudências recentes, etc) do livro Legislação Criminal Especial, Volume 6 da Coleção Ciências Criminais, Coordenação LFG e Rogério Sanches Cunha, editora RT,